sexta-feira, 11 de julho de 2014

Amor dos Deuses.



“Como raiz de uma terra seca; não tinha beleza nem formosura, e olhando nós para ele, não havia boa aparência nele para que o desejássemos”.

 No capitulo 53 do livro que leva seu nome o profeta Isaías diz sobre a ausência de beleza física em Jesus Cristo, fala da formosura que o redentor não possuía, isso surpreende os artistas que ilustravam as belas figuras do “Renascimento”, o Cristo representado em telas e nas telas de cinema goza de atributos estéticos admiráveis, dispõe de características atraentes, há portanto, a clara indiferença por parte dos ilustradores acerca da descrição feita pelo profeta que anunciou a chegada do salvador, desse ponto, imaginar uma figura divina desprovida de atrativos que encantam os olhos seria bastante embaraçoso, assim, fica possível justificar a versão dada pelos responsáveis em ilustrar a imagem de Cristo, uma versão em oposição a verdadeira face daquele que trouxe a salvação.

 O grande personagem do cristianismo vai no caminho inverso dos demais deuses das principais mitologias, Jesus conforme descrito em seu evangelho não possui uma deusa a quem dedicar seu infinito amor, mesmo encarnado na figura masculina, se trata de um deus sem gênero, fixo apenas em sua divindade neutra, a saga de Jesus contada por Marcos, Matheus, Lucas e João mostra um deus com a única missão de ensinar ao mundo valores altruístas, transmitir a mensagem do amor ao próximo, Cristo traz consigo a promessa de uma nova Jerusalém, com ruas e calçadas de ouro e anjos cantando hosana nas alturas. A saga de Jesus Cristo é basicamente isso, onde as ações calcadas no amor garantirão ao bom samaritano o eterno deleite na dourada Jerusalém.

 Não se pode ignorar que em toda boa história existe a necessidade de haver um antagonista, um vilão que se oponha ao mocinho, que se objete ao herói, mesmo Cristo sendo onipotente, sendo a maior personalidade de todos os tempos, o ser mais influente, o maior mito narrado pelo homem, mesmo ele não poderia deixar de ter um adversário, um vilão para apimentar sua caminhada na batalha contra o pecado do mundo, surge então Satanás, originalmente nomeado por Lúcifer, não poderia haver vilão mais apropriado para Jesus cristo, afinal, Lúcifer conhecido também como Belzebu era ninguém menos que o modelo de perfeição, repleto de sabedoria e de perfeita beleza, Satanás era a mais sábia criatura que Jeová inventou, o deus Jeová jamais criou um anjo ou outro ser com a inteligência dessa criatura, Deus diz que essa criação é "de perfeita beleza", aparte da Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, esta criatura é hoje o ser mais elevado.  

 Antes e depois de Cristo Satanás foi quem sustentou o grande ibope no âmbito dramático da narrativa cristã, os contos relatados na bíblia sagrada tiveram infinitos personagens, histórias de amor e traição, milagres, fábulas, comédia, ação e tragédias, todavia, todas elas eram representadas por humanos atingidos pela glória do deus Jeová, estavam esses personagens inseridos em episódios fadados, episódios com um fim certo, seja ao sucesso ou ao fracasso o enredo dramático dos contos bíblicos dispunham de um desfecho e resultados pré-destinados, uma vez que a onisciência de Deus já havia determinado o fim da trama envolvendo seus servos humanos, seria como ler revistas de fofoca que anunciam o que vai acontecer nos episódios seguintes da novela, seria como ser vítima de spoilers e saber antecipadamente o desfecho de um bom filme antes mesmo de tê-lo assistido, tudo isso põe Satanás na condição do personagem do mal mais curioso e completo em comparação aos vilões de outras mitologias, pois mesmo já  derrotado, mesmo sendo um poderoso e habilidoso rival, Satanás de nada vale diante da glória de Deus, Satanás é conhecido como o mestre da sedução, o arquiteto do marabalismo político que conduz esse mundo corrupto a perdição, é considerado uma entidade milenar de astúcia inigualável, é mencionado diariamente como aquele que irá tragar a alma daqueles que cederem a tentação, falar da missão de Satanás enquanto vilão nos obriga a admitir que ele de fato é um grande sedutor, afinal, ele conseguiu convencer o onipotente Jeová a assistir e permitir suas ações malignas que levarão parte de seus amados filhos para o fogo e tormento eterno, mas não podemos subestimar o criador do céu e da terra, talvez antes da consolidação dos tempos ele mude esse plano criado através dos séculos, pois nem homens e nem o Diabo podem alterar esse final glorioso cheio de amor e dor.

 Aparte todas essas circunstâncias que resumem a trama dos contos bíblicos, não pude deixar de ignorar que diferente da narrativa cristã, os grandes imbróglios que alimentam os enlaces e desenlaces embutidos nos enredos das principais mitologias não estão focalizados no irredutível ego do principal deus, a grande graça que dá ritmo aos contos das mitologias grega, egípcia, asiática, nórdica, amazônica e outras não mencionadas aqui, é a contextura criada pela diversidade de deuses, pois elas não se limitam em uma única ordem absoluta, a divindade existente nos demais folclores politeístas permite ao leitor se debruçar num universo dramático mais difuso, a inserção do leitor na fantasia se torna mais abrangente em razão da pluralidade do caráter divino, uma vez que os anseios e vontades dos personagens não estão centralizados em uma única entidade absoluta.

 A famosa Maria Madalena protagoniza polêmicas junto ao clero, a mais célebre prostituta do novo testamento talvez seja a personagem que mais tenha despertado interesse nos estudiosos em razão de sua suposta  tentativa de seduzir Jesus, enquanto teólogos especulam esse provável envolvimento, Freya a deusa da fertilidade e da beleza derrama suas lágrimas à espera de seu grande amor o deus Odur, aquele que anda pelos céus, a bela Freya líder das Valquírias, das guerreiras do território de Asgard é conhecida como a deusa da luxúria, tais qualidades despertaram o desejo em Loki o deus do fogo, mas esse amor não foi permitido por Odin, já nos contos gregos, amores proibidos transcorriam de modo diferente, veja o  caso de Perséfone a deusa da primavera que posteriormente viria a ser também a deusa do submundo, Perséfone a filha de Zeus a mais bela deusa do Olimpo negava seu amor a todos que lhes desejavam, Hades o deus do submundo também foi uma das vítimas do poderoso charme de Perséfone, Hades contudo, tomou o amor da jovem deusa a força, raptou Perséfone e a levou para o submundo tornando-a conhecedora tanto da luz quanto das sombras, tornando-a senhora das magias ocultas.

 Nas paredes das ruínas do Egito foi registrado que o amor do deus Osíris e da deusa Isis foi mais forte do que as leis da vida, Osíris foi traído pela ambição de seu irmão e perdeu a vida após uma cilada mortal, Isis reuniu os restos mortais de Osíris e o reconstitui, através da força desse amor divino Isis deu a Osíris novo fôlego e assim ambos viveram um amor póstumo e conceberam um filho, já nos contos japoneses, o amor entre Izanami e Izanagi  deram frutos maiores, mais do que um filho esse amor deu origem a vida humana, os deuses primordiais elegeram a jovem deusa Izanami e o jovem deus Izanagi para criarem o “céu e a terra”, a forte paixão que havia na relação de Izanagi e Izanami os inspirou a criar todas as formas de vida na terra.

 Dentre os mitos e lendas registrados ao longo dos séculos pouco se fala sobre a mitologia Amazônica, milhares de obras de ficção foram inspiradas por esses contos mitológicos citados à cima, entretanto, o espaço reservado ao folclore amazônico é insignificante em relação as mitologias mais famosas. Tupã o criador do universo, o deus do trovão, o deus que habita no sol, goza de uma imponência superior a de Zeus, criou o bem e o mal assim como Jeová, porém não há interesse por parte dos autores de ficção em realizar obras a partir das lendas que falam acerca da glória de Tupã, de certo modo é compreensível, pois as características de Tupã muito se assemelham aos adjetivos dos deuses de outros povos.

 Seria válido portanto, realizar uma fusão desses contos, levar Tupã à Asgard para se embriagar com barris de cerveja, convidar Odin ao Olimpo para apreciar as medéias em seus dolorosos cantares, mostrar a Hades a escuridão existente nos subterrâneos das pirâmides do Egito, levar Zeus ao sol e mostrar-lhe o tropicalismo, mostrar a Izanagi os encantos de Valhalla.

 Essa mistura daria origem a novas divindades, tanto Freya, Isis, Izanami, Perséfone mostrariam novos encantos aos novos deuses, mas o maior problema passional seria causado pela deusa Aracy, a deusa lua, aquela que governa a noite e as estrelas, se Hades a raptasse e a levasse ao submundo ela o iluminaria com sua tênue luz lunar, se Izanagi a convidasse para criar novas ilhas ou um novo mundo ela lhe mostraria as belezas da América, Osíris certamente agradeceria a Isis por lhe dar uma nova vida, permitindo assim que ele contemplasse tamanha beleza, se Zeus clamasse por um conto ela recitaria maravilhas homéricas jamais ouvidas, se Odin a convidasse para beber em Valhalla ela brindaria em nome da terra e causaria encanto aos assentados à mesa, Thor e Loki sentiriam-se crianças diante da celebração da bela Aracy, tais situações foram imaginadas por Tupã, por isso ele se omite e se esconde diante dessa guerra de vaidades travada pelos deuses, ele é o grande privilegiado pelo amor da mais belas dentre as deusas, Tupã bem sabe que se o esplendor da bela Aracy vier a tona, até mesmo Jeová e Satanás entrarão nessa briga para conquistá-la.

 Todos Eles são pegos pelo movimento da lua, mas apenas Tupã sabe o que tem por traz do mais belo astro que ilumina o universo. Tupã sabe que diferente dele mesmo e de todos os deuses existentes, Aracy é a única entidade que de fato sabe o que é amar, dela não emana ódio e nem justiça, não emana vaidade,  ela não clama por adoração.

Glórias à Aracy a verdadeira deusa do amor!