quarta-feira, 25 de maio de 2011

Cozinha do inferno

O principal ponto de divergência entre eu e minha mãe reside nos conceitos gastronômicos, decidi então desafiá-la a um duelo, o vencedor do duelo será determinado por um júri imparcial de diferentes faixas etárias proveniente da região do respectivo prato a ser avaliado, esse desafio será disputado em sete dias, terá seu início em uma segunda-feira e o seu fim no seguinte domingo, onde em cada dia prepararemos pratos específicos das seguintes cozinhas - italiana, árabe, portuguesa, alemã, mineira, nordestina e lanches baseados em fast food norte americano - ambos irão dispor de ferramentas equivalentes necessárias para o bom preparo e de ingredientes nobres que irão garantir a qualidade do produto final.

Determinado em derrotar minha mãe e dar fim às nossas eternas discussões de cozinha, fui ao mercado municipal de São Paulo selecionar ervas para tempero e adorno, busquei também algumas especiarias peculiares que certamente desequilibrará o embate em meu favor, nessa busca por ingredientes especiais entendi porque São Paulo é a capital mundial da gastronomia, esse título é reconhecido mundialmente pela multiplicidade de cozinhas que se encontram representadas nos restaurantes e bares de São Paulo, hoje são mais de cinquenta capitais representadas gastronomicamente em São Paulo: Brasil, Alemanha, Angola, Argentina, Armênia, Austrália, Áustria, Bélgica, Bulgária, Cabo Verde, Canadá, Chile, China, Coréia, Cuba, Caribe, Dinamarca, Egito, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Grã-Bretanha, Grécia, Holanda, Hungria, índia, Indonésia, Irlanda, Israel, Itália, Japão, Líbano, Marrocos, México, Noruega, Paraguai, Peru, Polônia, Portugal, República Tcheca, Romênia, Rússia, Sérvia (Croácia), Síria, Suécia, Suíça, Tailândia, Uruguai, Venezuela, Vietnã, com isso, esse título concedido à São Paulo é de grandeza equivalente à essa metrópole superlativa.

O que determina a boa qualidade de um prato é a positiva aceitação do paladar do apreciador, assim portanto, vale dizer que a melhor culinária do mundo se encontra no Haiti, o título de capital mundial da gastronomia deveria ser transferido para Porto Príncipe, veja, na Alemanha eles se empanturram com boa cerveja, deleitam-se no agradável sabor de carneiro na mostarda, saladas de maçã e aves com cogumelo, no Japão é saboreado um bom caldo de brócolis seguido por um omelete com camarão e um clássico gohan adocicado que é antecedido por uma água ardente de arroz, na Espanha um pato ao creme é sempre bem vindo diante de uma boa sangria e uma saborosa batata assada, em Portugal não há quem resista a um bacalhau ao vinho e de sobremesa um arroz doce português, os típicos apreciadores de tais pratos se deliciam ao saborearem seus bons ingredientes preparados sob fantásticas receitas de orgulhosa tradição de cunho artístico, entretanto, eles não saboreiam seus apetitosos e tradicionais pratos com prazer superior em comparação a um haitiano no momento de suas refeições, tenho como exemplo os emblemáticos e principais restaurantes encontrados nos principais centros de gastronomia de todo o mundo, nesses respeitáveis e luxuosos restaurantes conseguimos encontrar clientes apreciadores descontentes com o serviço prestado, há quem reclame da temperatura do vinho, há quem critique a maturação e fritura da carne, há quem recrimine a configuração estética do prato, há quem rejeite a composição do molho, por mais que o chefe cozinheiro se dedique no preparo dos pratos, sempre haverá alguém descontente com um determinado ponto de desequilíbrio em seu pedido, essa imperfeição inerente a todos os restaurantes, bares e lancheterias de todos os cantos do mundo não é encontrada na Cozinha do inferno, principal restaurante situado em Porto Príncipe capital do Haiti.

Na Cozinha do inferno encontramos ingredientes descartados pelo mundo inteiro, os chefes de cozinha da Cozinha do inferno são verdadeiros gênios da gastronomia, eles dispõem dos piores ingredientes do mundo e de maneira inexplicável seus clientes estão sempre satisfeitos, um fenômeno não conquistado pelos principais chefes europeus que mesmo dispondo de ingredientes nobres de excelente qualidade não conseguem a plena satisfação de sua clientela, os frequentadores da Cozinha do inferno têm a disposição um cardápio vasto com diversas opções, nesse cardápio também tem opções de sabores destinados aos porcos que de modo doméstico dividem do mesmo ambiente desse estabelecimento com os clientes humanos, nesse gigantesco restaurante vemos crianças, gatos, cachorros disputando seu café da manhã na lateral da cozinha, receio que essa enorme procura e disputa seja fruto da primorosa condição dos alimentos encontrados na Cozinha do inferno, um restaurante sempre cheio, com alto pico de movimento, fluxo contínuo, não há restaurante no mundo que supere a alta procura da Cozinha do inferno, não existe carta de bebidas nesse restaurante, na Alemanha existem milhares de sabores e tipos de cervejas, em Portugal os melhores vinhos, já em Porto Príncipe eles misturam uma secreta composição química às sagradas águas dos poluídos córregos haitianos, dessa fusão surge uma bebida extremamente saborosa, de acordo com o paladar haitiano não há bebida no mundo mais saciante do que a água benta da Cozinha do inferno, considerando todos os atributos dessa fenomenal culinária de Porto Príncipe é possível dizer que na capital haitiana existe o melhor restaurante do planeta, pois a Cozinha do Inferno é o único restaurante do mundo onde não existe reclamação e todos os consumidores estão sempre felizes.

Caso eu venha a ser derrotado pela minha mãe nesse duelo diante dos fogões, eu irei fazer um estágio no Haiti para entender um pouco mais de alimentação e assim derrotar minha mãe em um novo embate gastronômico.

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Sorriso de Elis.


Mckinley Morganfield diante de Faraó teria negociado a libertação dos judeus com eficiência diplomática superior a de Moisés o príncipe do Egito, a petição de Mckinley seria calcada na misericórdia, de alguma maneira ele teria conquistado a liberdade do povo judeu sem a necessidade das dez pragas, aquilo foi um exagero, rios convertidos em sangue, tempestade de gafanhotos, chuvas em chamas ácidas, chagas flamejantes, um verdadeiro genocídio.

Se concebermos grandes fenômenos de tragédia histórica perceberemos a limitação argumentativa de grandes governantes da história, se trata de seres de visão arbitrária e estreita, podemos citar como exemplo Nabucodonosor imperador do período babilônico, esse é um modelo clássico de incapacidade argumentativa, incapaz de refletir sob um tema que foge de sua órbita de governo, Daniel, Sadraque, Mesaque e Abedenego não seriam lançados na fornalha não fosse o imponente ego do imperador babilônico, mencionar exemplos de nossa realidade revelará que o terrorismo habita na inflexibilidade racional de nossa monarquia democrática, o terrorista por opção é um perigo à vida, no entanto, o conceito de terrorismo abrange uma pauta maior do que imaginado, sobretudo quando atos terroristas advém da fonte de proteção, dos legisladores da ordem e da paz, nesse caso não há com escapar, pois esses executivos do bem não se escondem em pseudas mansões ou em montanhas, se revelam em santinhos em período eleitoral, terroristas apoiados pelo clero protestante e milionário, a esses, Nelson Cavaquinho seria uma grande ameaça, seria uma ameaça a filosofia nazista, de boteco em boteco ele seduziria as moças de pele branca e de sangue nobre, seria uma afronta a estatura de Adolf, Nelson Cavaquinho seria uma injúria a qualquer república absolutista, seu samba desmancha grilhões, um perigo, talvez sua elegância fosse uma poderosa arma militar anti-terrorismo.

Já ouvi falar sobre armas atômicas que dizimam extensões territoriais incalculáveis, também ouvi e vi o sorriso de Elis, veja, quando especulam acerca de prováveis desastres nucleares, ou até mesmo em catástrofes ambientais, há quem repouse ou reflita em explicações e proteções de cunho religioso ou divino, digo que esse refúgio religioso é o menos confortante, pois os clientes das grandes instituições religiosas são conquistados ou persuadidos através de ameaças apocalípticas e de tortura após a morte, em outras palavras a busca por refúgio se torna mais complexa e dolorosa, há quem confie na nova ordem de governo mundial, mas basta olharmos nos olhos de nossos governantes que enxergaremos pedofilia e abuso de poder, em meio a tanta crueldade de cima pra baixo e em meio a forçada crueldade de baixo pra cima, escolho repousar no sorriso de Elis.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Badge

Não é verdade dizer que tatuagens são marcas para o resto da vida, em determinado versículo bíblico dizem que a palavra nunca volta vazia, a fixação da palavra mal proferida é mais marcante do que uma tatuagem, pois, basta uma cirurgia a laser que a tatuagem desaparecerá, se o caso for, basta remover a tira de couro onde a tatuagem foi forjada que a nova pele se regenerará sem a indesejada marca, se consideramos a conseqüência do que é dito perceberemos que a palavra é mais poderosa do que documentos impressos, pois a queima de arquivos em matéria concreta ocultará a informação proibida, porém os acordantes sempre saberão entre si o que foi estabelecido no acordo; assim, é importante nos atentarmos ao que publicamos na internet, tudo que é publicado em redes sociais fica registrado para sempre, imagens, vídeos e pensamentos compartilhados de modo público serão patrimônios de todos, é um caminho sem volta, pois em um único clique a informação compartilhada se multiplica em bilhões de cópias no mundo inteiro em questão de segundos, é como subir no alto de um edifício e derramar um enorme saco carregado de penas, por mais que tentem, as penas derramadas jamais serão resgatadas por completo, portanto meus irmãos, voz exorto quanto aos maus sentimentos que são expressos nas redes, saibam que eles jamais se apagarão, sempre estarão em algum espaço guardado em algum HD em algum canto do mundo, e ainda que tais informações indesejadas sejam deletadas por completo, saibam que essas mesmas informações estarão eternamente gravadas na memória daqueles que viram, portanto, sejam sábios e ponderem aquilo que é exposto.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Me versus Eu

É Possível sim resgatar elementos eliminados pelo tempo, me refiro a elementos úteis, inúteis em situações passadas, mas que teriam valiosa serventia se dispostos em futura situação, onde tais elementos se enquadrariam com os requisitos exigidos pela situação nova, afinal, no arquivo da subconsciência não existe “delete”, lá tudo está, arquivos bem armazenados e protegidos por selos violáveis, vale então dizer que os desejáveis elementos outrora dispensáveis, na verdade não foram eliminados pelo tempo, mas sim selados e protegidos pelo subconsciente a fim de protegê-los de usuários ainda incapazes de manipulá-los, portanto, os selos de proteção postos sobre os poderosos “cofres da lembrança” serão abertos apenas quando o invasor dispor de condições para derrotar o sábio guardião dos cofres submersos nas profundezas do subconsciente.

A forte musculatura combinada com a eficiência do aparelho respiratório que abastecia velozes pulmões aliados ao sísmico sistema cardiovascular que impulsionava um perfeito fluxo sanguíneo, dava um belo rubor a branca pele da tímida menina, na mesma condição jovial, essa sincronia do organismo adolescente dava um excelente brilho aos meus antigos cabelos lisos e negros, todo esse vigor estético próprio da jovialidade alimentava minha perfeita visão de águia, com ela eu visualizava o sorriso da menina, uma visão tão poderosa que me permitia ouvir o sabor de seus lábios, entretanto, a força dessa visão vulcânica cegava-me dentro daquela embarcação, não conseguia enxergar a cor dos mares de Bertioga pelos quais planávamos, nem tampouco me recordo da configuração arquitetônica daquele porto medieval, suponho que esse perdido cenário me seria bastante útil na profana noite pentecostal do blues protagonizado por mim e alguns artilheiros dias atrás na vila de Paranapiacaba.

A florescente camiseta amarela em mim trajada durante o festivo luau dos gentis no estaleiro Santa bárbara iluminava o circulo de expectadores, refletia no rio noturno, mas não foi capaz de atrair a atenção da “nobile paranaense”, até os meus iluminados cabelos modelados em gel não bastaram para submetê-la à minha ilusão ali lançada, creio que o meu hoje tom de voz grave seria mais eficiente na busca de ludibriá-la do que aquele júbilo coletivo agúdo que cantava pérolas da música popular brasileira.

Más lembranças me convenceram a desistir de tentar derrotar o guardião dos cofres do subconsciente a fim de remover os selos que me revelarão ciências escapadas em épocas passadas, irei por um caminho menos perigoso, buscarei primeiro a plenitude financeira para ter condições de suborná-lo durante o embate caso eu venha fraquejar, é possível que essas propinas concedidas me poupem de um duelo desnecessário e me levem direto ao desejado rompimento do véu.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Sinfoniaria

Em comissões que discutem a inserção da arte e da cultura em todos os meios, modelos e instantes da vida cotidiana de uma sociedade moderna é possível visualizar uma vida em oposição à monotonia, seria a extinção do tédio, certamente veríamos todos os prédios acadêmicos implodidos e reerguidos para demandar o novo modelo de liberdade artística, os docentes que lecionam capitais e tabuadas às nossas crianças seriam transferidos de suas funções robóticas a cargos vívidos e desafiadores, nossos adultos e crianças aprenderiam a criar, todo o ser racional dominaria o conceito de criação, seria um mundo engenhoso apreciador da criatividade concreta, seriam vinte e quatro horas diárias de possibilidades improváveis e sem limites, existiriam fábricas de produtos duvidosos que seriam consumidos em demasia e sem hesitação, Jimmy Page certamente abriria uma fábrica de sinfonias, corpos vivos se readequariam por conta da enorme quantidade de calorias que seriam queimadas, haveriam marchinhas juninas, quadrilhas setembrinas, árvores frutificariam dinheiro e teríamos que criar um novo regime monetário, seria o fim de regimes e o surgimento da igualdade.

O fato é que essas comissões não existem, o que torna a realidade fantasiada nessa suposta comissão distante e improvável, por isso, tenho que levar meu irmão mais velho ao jazz enquanto há tempo, me vejo obrigado a levar minhas cunhadas a um passeio de zepelim em uma noite de domingo para que todos que estiverem por debaixo dessa embarcação que flutua por sobre as ondas das nuvens britânicas vejam seus leds luminosos que enfeitam o firmamento noturno assim como a imponente camisa verde limão que dominou as arquibancadas brasileiras.

Enquanto me houver a possibilidade de criar, enquanto eu compreender o poder e a graça da criação estarei livre de paradigmas e do falso brilho no olhar, brilho este encontrado apenas em refugiados da missa que se acomodam em um confortável sofá em noites de domingo a fim de apreciarem o “show da vida” enquanto se saboreia um delicioso prato com achocolatado em pó e leite condensado.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Desilusão

Quase que diariamente me confronto com o descompasso do “ontem” em relação ao “hoje”, suponho que se trata da contínua assimilação das ininterruptas invenções humanas, as novas considerações apreendidas diariamente se envergonham dos conceitos defasados da noite anterior, junto com essa arritmia dessas positivas absorções que são rapidamente eliminadas por novos sabores vem também a decepção com a estruturação padrão de quase todos os órgãos estabelecidos em sociedades civilizadas, o que dizer de nossos educadores que repousam em paradigmas obsoletos e que contraditoriamente se abstêm das fontes de raiz que deram origem a essência da matéria ensinada? Por conta de vários exemplos negativos na desarmoniosa constituição da verdade e até da mentira residente em nossos aparelhos sociais nos deparamos com freqüentes desilusões, nos deparamos com benéficas desilusões que nos possibilitam alçar vôos mais altos, afinal, o que realmente está errado nos conceitos tidos por exatos é a alienação produzida por essa exatidão incontestável e seguida cegamente.

Assim digo, o mundo tem que parar de avançar, caso contrário não poderei encará-lo de frente, pois não terei tempo suficiente para alcançá-lo.

Imagine você pobre mortal, como poderia entender a pentatônica da harmônica blues não fosse a criação instituída por Little Walter?

Foi um péssimo erro descobrir John Paul Jones enquanto pianista sintético, quem mais poderia criar “No Quarter”? Ele transpassou a lógica e fez jus aos seus poderosos parceiros de palco possuidores de maestria equivalente.

Hoje posso contemplar memórias graças aos admiráveis inventores de sinais gráficos, veja, como poderia contemplar algo sem conhecer o “CE”, o “O”, o “ENE”, o “TE”, o “E”, o “EME”, o “PE”, o “ÉLE”, o “A” e o “ERRE”?

Ao meditar sobre aquela idéia fixa que teima em sair, percebo que as recorrentes novidades apreendidas dão força a ela ao invés de expulsá-la, só não me perturbo com essa teima pois ainda não assimilei algo de tamanho superior à essa idéia fixa, no dia dessa assimilação terei envergadura para expurgá-la.

Essa crescente que é inerente ao ser é bastante confusa, quer seja em movimento ou estagnado o espírito não para de ascender, arrisco a dizer que quando estacionado a chama queima mais intensamente, o que permite dizer que o corpo dispõe de ação autônoma, mesmo sem percebermos estamos em frequente atividade.

Então que venham as desilusões, ainda que dance eu e dance você na dança da solidão, acreditem, não estamos sozinhos, basta olharmos pro lado e veremos milhares e milhares de inventores.